O Jogo dos Espelhos

Entre reflexos e ilusões, buscamos a nós

mesmos nos olhos do outro


Vivemos cercados de espelhos. Alguns de vidro, outros de carne e silêncio. O primeiro nos mostra o rosto; o segundo, a alma.


Narciso se afogou não por vaidade, mas por carência: apaixonou-se por uma imagem que nunca poderia tocá-lo de volta. E assim somos nós — encantados pela própria identidade, desejosos de sermos compreendidos, mas prisioneiros de um amor que não se consuma.


Apaixonar-se pelo próprio reflexo é o primeiro passo para se perder de si mesmo. Quando olhamos para os outros e vemos apenas o que queremos, transformamo-nos em espelhos distorcidos, incapazes de refletir verdadeiramente. Mas há aqueles que aprenderam a mirar fundo nos olhos alheios, a enxergar desejos ocultos, dores veladas, esperanças frágeis — e a devolvê-las como se fossem suas. Esses não seduzem com aparência, mas com empatia.


Refletir o que o outro sente é tocar sua carência com dedos invisíveis. É um poder sutil: quem domina a arte de espelhar a alma alheia carrega nas mãos a chave da intimidade. É raro ser verdadeiramente compreendido — por isso, quando alguém nos devolve o que somos com fidelidade, somos tomados por um êxtase calado, quase amoroso.


Mas o espelho também ensina, mesmo quando fere. Quando alguém nos devolve nossas atitudes — nossas palavras duras, nossas ausências, nossas ironias — sentimos o gosto amargo de nossas escolhas. Um espelho bem usado é uma arma sutil: não corta, mas revela. Quem faz o outro sentir o próprio veneno ensina mais do que mil sermões. Este é o espelho do mestre: aquele que não acusa, apenas mostra. E ao mostrar, transforma.


O Efeito Narciso seduz; o Efeito Moral transforma; o Efeito Alucinatório confunde — porque nos faz crer que o reflexo é realidade, quando é apenas ilusão.


Cuidado com o que você vê. Cuidado com o que reflete. Porque às vezes, ao olhar para os outros, é a si mesmo que você está tentando encontrar.



Diogo Oliveira 


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